Como Deus traz homens a Cristo? Os pregadores
arminianos geralmente dizem que Deus traz homens a Cristo por meio da pregação
do evangelho. É verdade; a pregação do evangelho é o instrumento para trazer
homens a Cristo, mas precisa haver algo mais que isso. A quem Cristo dirigiu
essas palavras? Ora, às pessoas de Cafarnaum, onde Ele pregava com freqüência,
onde Ele proferiu, com lamentação e tristeza, as maldições da lei, bem como os
convites do evangelho. Naquela cidade, o Senhor Jesus havia realizado muitos
sinais poderosos e diversos milagres. Na verdade, Ele ministrou aos moradores de
Cafarnaum tantos ensinos e operou tantas confirmações miraculosas, a ponto de
declarar que, se Tiro e Sidom houvessem sido abençoadas com tais privilégios,
há muito teriam se arrependido em pano de saco e cinzas.
Ora, se a pregação do próprio Cristo não foi
proveitosa para tornar esses homens capazes de vir a Ele mesmo, não é possível
que a pregação do evangelho fosse a única coisa idealizada por Deus para trazer
os homens a Jesus. Não, queridos irmãos, vocês têm de observar no- vamente: o
Senhor Jesus não disse que o homem não virá a Ele, se o ministro do
evangelho não o trouxer; e sim que se o Pai não o
trouxer. Ora, existe o ser trazido pelo evangelho e pelo pregador, sem ser
trazido por Deus. É claro que Jesus estava falando de ser trazido por Deus, o
Altíssimo — a primeira Pessoa da gloriosa Trindade —, enviando a terceira
Pessoa, o Espírito Santo, para induzir homens a virem a Ele, Jesus.
Alguém pode se levantar e dizer com escárnio:
“Então, você acha que Cristo traz os homens a Ele mesmo, vendo que os homens
não têm disposição para fazer isso?” Lembro-me de haver conhecido um homem que
disse: “Senhor, você pregou que Cristo apanha os homens pelos seus cabelos e os
traz a Si mesmo”. Perguntei-lhe se podia lembrar o dia em que preguei um sermão
contendo essa extraordinária doutrina. Se ele pudesse lembrar, eu ficaria
grato. Mas aquele homem não pôde lembrar tal dia. Eu lhe disse que, embora
Cristo não traga ninguém a Ele mesmo, puxando-o pelos cabelos, creio que Ele
traz pessoas por meio do coração, fazendo-o de maneira quase tão poderosa
quanto aquela ilustração poderia sugerir.
Observem que no trazer do Pai não há qualquer
compulsão. Cristo nunca obriga qualquer pessoa a vir a Ele contra a vontade
dela mesma. Se alguém não quer ser salvo, Cristo não o salva contra a vontade
dele mesmo. Então, de que maneira o Espírito Santo traz o homem a Cristo? Ora,
Ele o faz tornando o homem disposto. É verdade que o Espírito Santo não usa a
“persuasão moral”. Ele conhece um método mais fácil de alcançar o coração do homem.
O Espírito Santo vai às fontes secretas do coração e, sabendo exatamente como,
por meio de uma realização misteriosa, muda a direção da vontade humana, de
modo que, assim como Ralph Erskine o apresentou de modo paradoxo, o homem é
salvo “com pleno consentimento, contra a sua própria vontade”; ou seja, ele é
salvo contra a sua velha vontade. Mas ele é salvo com pleno consentimento, pois
Deus o tornou disposto no dia do seu poder.
Não imaginem que qualquer pessoa irá ao céu
esperneando e gritando, em todo o caminho, contra a mão que o traz a Cristo.
Não imaginem que alguma pessoa será mergulhada no banho do sangue de Cristo,
enquanto se esforça para fugir de seu Salvador. Oh! Não. É verdade que, antes
de tudo, o homem não tem disposição de ser salvo. Quando o Espírito Santo
coloca a sua influência sobre o coração, o teste se cumpre: “Leva-me após ti”
(Ct 1.4). Seguimos, enquanto Ele nos atrai, felizes por obedecer à voz que
antes desprezamos.
Mas o âmago deste assunto se encontra na
transformação da vontade. Como isso acontece, ninguém sabe. Esse é um daqueles
mistérios que é percebido de maneira mais evidente através dos fatos; contudo,
ninguém pode descrevê-lo, nenhum coração pode imaginá-lo. A maneira aparente em
que o Espírito Santo age, nós podemos dizer-lhe. A primeira coisa que Ele faz,
quando vem ao coração de uma pessoa, é esta: Ele a encontra nutrindo uma
excelente opinião a respeito de si mesma. Ora, o homem diz: “Eu não quero vir a
Cristo. Tenho uma justiça pessoal tão boa, que qualquer pessoa pode desejá-la.
Sinto que eu posso chegar ao céu confiando em meus próprios direitos”. O
Espírito Santo desnuda tal coração, fazendo-o ver o câncer repugnante que está
devorando sua vida; descobre à pessoa todas as trevas e corrupção daquele
recinto infernal, o coração humano; assim, a pessoa fica horrorizada. “Nunca
pensei que eu fosse assim. Aqueles pecados que julgava insignificantes se
acumularam e atingiram uma proporção imensa. Aquilo que eu julgava ser um
montículo cresceu e se tornou uma montanha elevada; era apenas um arbusto,
agora é um cedro do Líbano. Oh!”, diz a pessoa a si mesma, “tentarei reformar a
minha vida; farei boas obras suficientes para limpar completamente estas obras
mortas”. Então, o Espírito Santo lhe mostra que ela não pode fazer isso e
remove todo o poder e a capacidade ilusória da pessoa, de modo que ela se
prostra, em seus joelhos, clamando em agonia: “Oh! Pensei que poderia salvar a
mim mesmo por meio de minhas boas obras, mas percebo que,
Se minhas lágrimas jorrassem
eternamente,
Se meu zelo não conhecesse
nenhum limite,
Tudo que fizesse pelo pecado
não o expiaria.
Tu, Senhor, e somente Tu,
podes salvar-me”.
Se meu zelo não conhecesse
nenhum limite,
Tudo que fizesse pelo pecado
não o expiaria.
Tu, Senhor, e somente Tu,
podes salvar-me”.
Depois que o coração afunda, o homem está pronto
para entrar em desespero. E diz: “Nunca posso ser salvo. Nada me pode salvar”.
Neste momento, o Espírito Santo se aproxima e mostra ao pecador a cruz de
Cristo, outorgando-lhe olhos ungidos com colírio celestial e declarando: “Olhe
para aquela cruz, o Homem que ali morreu salva pecadores. Você sente que é um
pecador; Ele morreu para salvá-lo”. Assim, o Espírito Santo capacita o coração
a crer e a vir a Cristo. E, quando o homem vem a Cristo, pelo amável trazer do
Espírito, encontra a “paz de Deus, que excede todo o entendimento” e guarda sua
mente e seu coração em Cristo Jesus (Fp 4.7).
Agora você percebe claramente que tudo isso pode
ser feito sem qualquer compulsão. O homem é trazido com tanta voluntariedade
como se não tivesse sido atraído. Ele vem a Cristo com todo o seu
consentimento, como se nenhuma influência secreta houvesse agido em seu
coração. Mas essa influência tem de ser exercida, pois, do contrário, nunca
haveria (nem haverá) qualquer pessoa que poderia ou desejaria vir ao Senhor
Jesus Cristo.
Fonte: Editora Fiel
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