A fim de ajudar o leitor a identificar o verdadeiro
arrependimento, considere os frutos que o demonstram.
1. Um ódio pelo pecado como pecado, e
não apenas por causa de suas conseqüências. Deve haver um ódio não somente
por este ou aquele pecado, mas por todos os pecados e, em especial, pela
própria origem do pecado: a vontade própria. “Assim diz o
Senhor Deus: Convertei-vos, e apartai-vos dos vossos ídolos, e dai as costas a
todas as vossas abominações” (Ez 14.6). Aquele que não odeia o pecado ama-o. A
exigência de Deus é: “Tereis nojo de vós mesmos, por todas as vossas
iniqüidades que tendes cometido” (Ez 20.43). Aquele que se arrependeu
verdadeiramente pode dizer: “Detesto todo caminho de falsidade” (Sl 119.104).
Aquele que considerava o viver santo como uma coisa monótona agora pensa de
modo diferente. Aquele que considerava atraente uma vida de auto-satisfação
gora detesta-a e determinou abandonar para sempre todo pecado. Essa é a
mudança na maneira de pensar que Deus exige.
2. Uma profunda tristeza para causa
do pecado. O arrependimento que não conduz à salvação é, principalmente, uma
aflição ocasionada pelos presságios da ira de Deus. O arrependimento evangélico
produz uma profunda tristeza proveniente de um senso de haver ofendido um Ser
tão infinitamente glorioso e excelente como Deus. O arrependimento que não
salva resulta de temor; o arrependimento evangélico é fruto do amor. Aquele é
momentâneo, este é uma prática habitual que ocorre durante toda a vida. Um
homem pode estar cheio de pesar e remorso por causa de uma vida mau utilizada e
não ter uma tristeza pungente de coração por sua ingratidão e rebeldia contra
Deus. Contudo, uma alma regenerada é profundamente afetada por ter
desconsiderado e vivido em oposição ao seu grande Benfeitor e legítimo
Soberano. Essa é a mudança de coração que Deus exige.
“Fostes contristados para arrependimento; pois
fostes contristados segundo Deus... Porque a tristeza segundo Deus produz
arrependimento para a salvação” (2 Co 7.9-10). Essa tristeza é produzida no
coração pelo Espírito Santo e tem a Deus como seu objeto. É uma tristeza por
haver desprezado a Deus, se rebelado contra a sua autoridade e sido indiferente
à sua glória. É isso que nos faz chorar “amargamente” (Mt 26.75). Aquele que
não se entristece por seus pecados deleita-se neles. Deus exige que aflijamos
nossa alma (Lv 16.29). A sua chamada é esta: “Convertei-vos a mim de todo o
vosso coração; e isso com jejuns, com choro e com pranto. Rasgai o vosso
coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao Senhor, vosso Deus, porque
ele é misericordioso e compassivo” (Jl 2.12-13). A verdadeira tristeza pelo
pecado é aquela que nos faz crucificar “a carne, com as suas paixões e
concupiscências” (Gl 5.24).
3. Uma confissão de pecados. “O que
encobre as suas transgressões jamais prosperará” (Pv 28.13). Negar os pecados,
direta ou indiretamente, minimizar ou apresentar desculpas para eles está de
acordo com a natureza do pecador. Foi assim que Adão& Eva agiram no
princípio. Mas, quando o Espírito Santo age em uma alma, seus pecados são
trazidos à luz, e a pessoa os reconhece diante de Deus. Não haverá descanso
para o coração quebrantado, a menos que a pessoa faça isto: “Enquanto calei os
meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo o
dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em
sequidão de estio” (Sl 32.3-4). O reconhecimento sincero e humilde de nossos
pecados é imperativo, para que a paz de consciência seja mantida. Essa é a
mudança deatitude que Deus exige.
4. Uma conversão do pecado. “Com certeza,
não há ninguém aqui entorpecido com o sedativo da indiferença infernal, a ponto
de imaginar que pode se deleitar em suas concupiscências e, depois, vestir as
vestiduras brancas dos redimidos que estão no Paraíso. Se vocês pensam que
podem ser participantes do sangue de Cristo e beber o cálice de Belial; se
imaginam que podem ser, ao mesmo tempo, membros de Satanás e membros de Cristo,
têm menos entendimento do que alguém poderia creditar-lhes. Não, vocês sabem
que a mão direita tem de ser cortada, e olho direito, arrancado — que os
pecados mais queridos têm de ser renunciados — se querem entrar no reino de
Deus” (citado de Spurgeon, comentando sobre Lucas 13.24).
O Novo Testamento usa três palavras gregas que
apresentam as diferentes fases do arrependimento. A primeira é metanoeo, que significa
“uma mudança de mentalidade” (Mt 3.2; Mc 1.15, etc.). A segunda é metanolomai, que significa
“uma mudança de coração” (Mt 21.29, 32; Hb 7.21). A terceira é metanoia, que significa
“uma mudança do curso de vida” (Mt 3.8; 9.13; At 20.21). As três mudanças
precisam ocorrer juntas para que haja verdadeiro arrependimento. Muitos
experimentam uma mudança de mentalidade; são instruídos e sabem melhor, mas
continuam a desafiar a Deus. Alguns são até exercitados em sua consciência e
coração, mas continuam no pecado. Alguns melhoram seus caminhos, mas não por
amor a Deus e ódio ao pecado. Alguns têm a mente informada e o coração
inquieto; e nunca mudam sua vida. Esses três conceitos têm de andar juntos.
“O que encobre as suas transgressões jamais
prosperará; mas o que as confessa e deixa alcançará misericórdia” (Pv 28.13).
Aquele que, de todo o coração& e durante a sua vida, não se converte dos
seus caminhos ímpios não se arrependeu. Se odiamos o pecado e o lamentamos, não
o abandonaremos? Observe com atenção o “andastes outrora” de Efésios 2.2 e o
“outrora éramos” de Tito 3.3! “Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo, os
seus pensamentos; converta-se ao Senhor, que se compadecerá dele, e volte-se
para o nosso Deus, porque é rico em perdoar” (Is 55.7). Essa é a mudança decaminho que Deus exige.
5. Acompanhado de restituição quando
isso é necessário e possível. Nenhum arrependimento pode ser
verdadeiro se não está acompanhado de completa reparação da vida. A súplica de
uma alma arrependida é: “Cria em mim, ó Deus, um coração puro e renova dentro
de mim um espírito inabalável” (Sl 51.10). E, quando uma pessoa deseja
realmente acertar as coisas com Deus, ela faz isso também com seus semelhantes.
Alguém que, em sua vida passada, errou contra outra pessoa e agora não faz
nenhum esforço, conforme todas as suas possibilidades, para corrigir o erro,
certamente não se arrependeu! John G. Paton contou certa vez que a primeira
coisa que um escravo fez, depois de converter-se, foi devolver ao senhor tudo
que roubara dele.
6. Estes frutos são permanentes. Visto que o
arrependimento é precedido por uma compreensão da amabilidade e da excelência
do caráter de Deus e uma apreensão da excessiva malignidade do pecado, por
haver tratado com tanto desprezo um Ser tremendamente glorioso, a contrição e
um ódio pelo mal são imprescindíveis. À medida que crescemos na graça e no
conhecimento do Senhor, de nossa dívida e obrigações para com Ele, nosso
arrependimento se aprofunda, julgamos a nós mesmos mais amplamente e assumimos
um lugar cada vez mais humilde diante dEle. Quanto mais o coração anela por um
andar mais íntimo com Deus, tanto mais ele lançará fora tudo que impede isso.
7. O arrependimento nunca é perfeito
nesta vida. Nossa fé jamais é tão completa, que chegamos ao ponto em que o
coração não é mais embaraçado com dúvidas. E nosso arrependimento nunca possui
tal pureza que se torna completamente isento de dureza de coração. O
arrependimento é um ato que dura toda a vida. Precisamos orar cada dia por um
profundo arrependimento.
Em vista de tudo que dissemos, cremos que deixamos
bem claro a todo leitor imparcial o fato de que os pregadores que repudiam o
arrependimento são, para as infelizes almas perdidas, “médicos sem valor”.
Aqueles que ignoram o arrependimento estão pregando “outro evangelho” (Gl 1.6),
e não o evangelho que Cristo (Mc 1.15; 6.12) e os apóstolos pregavam (At 17.30;
20.21). O arrependimento é um dever apresentado no evangelho. Aqueles que nunca
se arrependeram ainda estão presos nos laços do Diabo (2 Tm 2.25-26) e acumulam
contra si mesmos ira para o dia da ira de Deus (Rm 2.4-5).
“Se, portanto, os pecadores querem fazer melhor uso
dos meios da graça, devem tentar harmonizar-se com o propósito de Deus e as
influências do Espírito Santo, empenhando-se por perceberem seu estado
pecaminoso, culpado e condenatório. Para isso eles devem abandonar as
companhias vãs, descartar seus interesses mundanos e ordinários, deixar tudo
que tende a mantê-los seguros no pecado e abafar as ações do Espírito. Para
isso eles devem ler, meditar e orar, comparando-se a si mesmos com a santa Lei
de Deus, tentando ver a si mesmos como Deus os vê e atribuindo a si mesmos o
juízo que Deus lhes atribui. Assim, poderão dispor-se a aprovar a Lei, admirar
a graça do evangelho, julgar a si mesmos, aplicar humildemente a todas as coisas
a graça gratuita de Deus e retornar a Deus por meio de Cristo” (citado de
Joseph Bellamy, 1719-1790).
Um resumo do que falamos pode ser proveitoso para
alguns: 1. O arrependimento é um dever evangélico, e nenhum pregador tem o
direito de considerar-se servo de Cristo se não fala sobre este assunto (Lc
24.47). 2. O arrependimento é exigido por Deus nesta dispensação (At 17.30),
assim como nas anteriores. 3. O arrependimento não é, de algum modo, meritório;
todavia, sem ele, o evangelho não pode ser crido de maneira salvífica (Mt
21.32; Mc 1.15). 4. O arrependimento é uma compreensão, outorgada pelo
Espírito, da excessiva malignidade do pecado e um posicionar-me contra mim
mesmo ao lado de Deus. 5. O arrependimento pressupõe uma aprovação sincera da
Lei de Deus e uma plena aquiescência às suas exigências justas, que são
sintetizadas em “amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração...” 6. O
arrependimento é acompanhado por um ódio genuíno e uma tristeza pelo pecado. 7.
O arrependimento é evidenciado por um abandono do pecado. 8. O arrependimento é
conhecido por sua permanência: tem de haver um contínuo afastar-se do pecado e
um entristecer-se por todas as quedas no pecado. 9. O arrependimento, embora
permanente, nunca é perfeito ou completo nesta vida. 10. O arrependimento deve
ser buscado como um dom de Cristo (At 5.31).
Extraído de Arrependimento: o Que
Dizem as Escrituras?, reimpresso por Chapel Library.
Traduzido por: Wellington Ferreira
Fonte: Editora Fiel
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